A Villa Matarazzo

Pela rua Direita um automóvel vinha assustando muitos pedestres ainda mal acostumados com a novidade. Sim, já há alguns anos que Henrique Santos-Dumont rodava pela capital com um veículo a vapor, e vivia em atrito com a Prefeitura por conta dos mal estado das ruas e da insistência da municipalidade em cobrar uma taxa sobre o veículo.

Por conta dessa quizília, apesar de oficialmente ter trazido o primeiro automóvel a percorrer as ruas da velha Piratininga, Henrique perdeu o direito de possuir a primeira placa de registro expedida pelo governo municipal.

Pois o tal automóvel de placa número 01 não se dirigia aos Campos Elíseos ou para Higienópolis, redutos da elite cafeicultura. Ao invés disso, subia vagarosamente a rua da Consolação, chamando a atenção dos raros transeuntes, até chegar na recém inaugurada avenida Paulista.

Praticamente despovoada, ainda se assemelhava a um arrabalde de chácaras, com muitas árvores e a magnífica vista que dali se descortinava. Levantando poeira no macadame da via, o auto estaca diante do número 83, uma grande casa térrea em estilo neoclássico.

Ali morava um homem alto, de bigodes negros e luzidia calva; na varanda a esposa o aguardava, acompanhada de alguns dos treze filhos do casal.

O cidadão em questão era o comerciante e industrial Francesco Matarazzo, italiano chegado no país em 1882. Não, não havia vendido bananas numa carrocinha pelas ruas da cidade como uma das lendas criadas pelos paulistanos.

Na verdade seu primeiro destino no Brasil foi a cidade paulista de Sorocaba, onde manteve armazém na rua da Penha, humilde endereço que seria a gênese do maior império industrial da América do Sul do século XX.

Inaugurada em 8 de dezembro de 1891, a avenida Paulista atraiu imigrantes enriquecidos, como Adam Von Bullow e Francesco Matarazzo, que construiu sua residência em 1896 num imenso terreno de 12 mil metros quadrados. Quatro anos depois uma reforma aumentava o número de dormitórios e salas, além de criar uma fachada simétrica no neoclássico em voga nesse tempo. Já foi na nova residência que, em 1901, nascia Francisco, o penúltimo filho do casal e que seria o herdeiro e continuador da obra paterna.

 

Construção da Mansão Matarazzo em 1945.

 

A sauna e a piscina da mansão quando ainda funcionavam.

 

 

fundos da mansão Matarazzo

 

Entre os anos 20 e 30 a casa sofre outra reforma, tornando-se assobradada; A Villa Matarazzo, já emblemática na cidade pelo morador ilustre, agora ganhava ares grandiosos, com uma ares mais modernos na fachada. Nesse período Chiquinho, casado com a prima Mariângela, já era o braço direito do pai na administração dos negócios. Essa decisão do Conde causou inúmeras desavenças familiares, resultando até mesmo em disputas na justiça.

Em 10 de fevereiro de 1937 a Paulista parou no enterro do Conde. A multidão seguiu o cortejo até o mausoléu da família no cemitério da Consolação.

Conde Matarazzo
Ele é o imigrante mais famoso que se conhece, tinha 27 anos quando veio para o Brasil em 1881, acompanhado por sua esposa, Filomena, e de dois filhos. Vinha de Castellabate, na Campanha (sudoeste da Itália), onde ficaram seus irmãos. Seu pai, advogado e proprietário de terras, havia falecido quando ele era ainda adolescente. A instabilidade política da Itália, decorrente das guerras de unificação (1860-1870), havia abalado as finanças da família, o que obrigou Francisco a ingressar no comercio, logo que terminou o curso secundário.
Ainda na Itália, adquiriu experiência empresarial criando porcos e dedicando-se a venda de toucinho e banha. O sonho de “fazer a América” foi o desafio que o trouxe ao Brasil, terra de novas oportunidades e mercados, para onde já tinha imigrado outros membros da comunidade de Castellabate. Ao embarcar para a nova pátria, Francisco trazia “bons conselhos e um milhar de liras” Junto com ele vinha também um carregamento de banha, que lhe permitia iniciar-se no comercio. Mas essa mercadoria naufragou nas costas brasileiras, o que desanimaria espíritos menos resolutos. O próprio Matarazzo, em entrevista posterior a Vicenso Blancato, relembra o começo de sua nova vida.


 

“Aqui desembarcando, com a bolsa cheia de vontade de trabalhar, dirigi-me para Sorocaba (interior de São Paulo), onde dei inicio a minha carreira, ajudado por meu conterrâneo, o qual reunia as funções de sapateiro e de conselheiro municipal.(...) Abri botequim, ou venda, como se diz aqui no Brasil”.
Estabelecido com esse empório em maio de 1882, Matarazzo dedicou-se ao comercio de importação de banha, farinha de trigo e outros gêneros, viajando freqüentemente a Santos e para a capital. A conjuntura

A conjuntura econômica da época extremamente favorável ao comercio, devido ao crescimento das cidades, trouxe prosperidade ao incansável comerciante.
Logo ele se voltaria também para a industria. Criar porcos, comprar da vizinhança e produzir banha foi uma feliz de Francisco. E mais feliz ainda a idéia de vendê-la em nova embalagem: a lata.
Na época a banha era importada dos estados Unidos e vinha em barris de madeira. As pequenas industrias nacionais do ramo usavam esses mesmos recipientes, que por serem grandes demais, dificultavam o comercio no varejo, oferecendo o perigo de deterioração da mercadoria. As pequenas latas de banha produzidas por Matarazzo fizeram sucesso no mercado.
Em 1888, ele possuía duas fabricas de banha, em Sorocaba e em Capão Bonito, com os ossos de porco, produziam também botões e barbatanas de colarinho. Em 1890, transferiu-se para a capital a fim de ampliar os negócios.
Dez anos depois, a 15 de março de 1900, vamos encontrá-lo inaugurando, no bairro do Brás, o imenso moinho Matarazzo, construído segundo os moldes da arquitetura inglesa e destinado a produzir farinha de trigo e massas alimentícias. A partir de então, seus negócios diversificaram-se notavelmente. Em 1902 a oficina mecânica do moinho foi transformada numa fabrica independente, da qual surgiria mais tarde a metalúrgica Matarazzo, e em 1904 seria inaugurada, também no Brás, a tecelagem de algodão Mariângela, que fazia sacos para embalar a farinha, tecidos estampados para vestimenta.
O aproveitamento das sobras de matéria-prima da tecelagem deu origem as fabricas de óleo e sabão Sol Levante, que utilizavam os caroços do algodão. Logo surgiriam em outros bairros de São Paulo e em outros estados, como no Paraná novas unidades Matarazzo, como uma serraria produtora de embalagens, artigos para carpintaria e fósforos. As industrias Reunidas F Matarazzo constituíam uma sociedade anônima da qual participavam o futuro conde e seus irmãos José e Luiz, que vieram da Itália no final do século XIX .
Até 1900, a principal fonte de credito da empresa era o London & Brazilian Bank. Mas, nesse mesmo ano, Francisco Matarazzo resolveu organizar sua própria casa bancaria.

enterro do conde Matarazzo

Em 1941 a casa é totalmente remodelada pelos arquitetos Morpurgo e Piacentini, responsáveis pela construção do edifício Matarazzo na praça do Patriarca, em 1939. Essa foi a imagem mais conhecida e que resistiu até janeiro de 1996, quando “desabou” com a chuva que castigava a cidade. Esse desabamento não foi acidental, obviamente. Desde 1988 sob disputa na justiça com a Prefeitura, que ali queria criar o Museu do Trabalhador, os herdeiros já haviam dinamitado estruturas do porão. A chuva só fez por completar o trabalho: na madrugada de 11 de janeiro aluiu a parte central do casarão

 

 

 

 

Nas semanas seguintes o que havia ficado em pé foi demolido por uma empresa, que certamente lucrou muito com todo o mármore travertino dos pisos e fachadas, com os encanamentos e calhas de cobre, com as maçanetas, dobradiças, portas e janelas. Enfim, era a pá de entulho na história de um império.

 

 

 

Fontes:t: http://saopauloantigo.blogspot.com/2007/11/villa-matarazzo.html

http://saudadesampa.

familiamatarazzo.blogspot.com/

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